
DAB em Portugal: ascensão e queda da tecnologia do futuro
O DAB (
Digital
Audio Broadcasting)
é uma tecnologia digital de radiodifusão que oferece um conjunto de
vantagens relativamente às actuais transmissões analógicas. Não
obstante as promessas de melhor qualidade de recepção e uma qualidade
de som comparável ao CD, o DAB em Portugal sempre teve, ao longo de 13
anos de vida, uma audiência residual. Neste artigo vamos abordar a
história do DAB no nosso país, sem perder de vista os factores que
levaram ao insucesso do sistema e até à revogação do alvará da rede de
emissores DAB da RTP.
Incentivada pelas
entidades internacionais do sector da radiodifusão, a antiga
Radiodifusão Portuguesa (hoje integrada na RTP, Rádio e Televisão de
Portugal) começou, no final dos anos 80, a estudar projectos para a
emissão digital de rádio. Em 1992, foram estabelecidas as bases para a
implementação da rádio digital em Portugal. No final de 1997, a RDP
obteve autorização para realizar uma demonstração do sistema em Lisboa;
esta operação foi efectuada em Janeiro de 1998, utilizando um receptor
fixo e um auto-rádio DAB cedido pela Grundig Portuguesa. Passados
alguns meses, a RDP, aproveitando a abertura da Expo 98, inaugurou
as emissões experimentais do DAB através de quatro emissores, a
saber: Lisboa (Monsanto), Arrábida e Montejunto, servindo grande parte
da região de Lisboa, além de um emissor no Monte da Virgem (Vila Nova
de Gaia). Enquanto a exposição mundial decorria no actual Parque das
Nações, a RDP manteve três viaturas Volkswagen Caravelle estacionadas
estrategicamente junto das portas da Expo 98 de forma a disponibilizar
aos visitantes nacionais e estrangeiros informação sobre o novo
sistema. Entre os dias 7 e 13 de
Dezembro do mesmo ano, a RDP apresentou o DAB no arquipélago da
Madeira. Alguns meses antes, em Agosto de 1998, foi entregue à RDP, na
sequência de um concurso público, uma licença de âmbito nacional
para a implementação e funcionamento de uma rede digital de emissores,
a qual foi atribuída em Março de 1999.
Em
1998, o DAB contava com 6 estações de rádio: Antena 1, Antena 2, Antena
3, RDP- Rádio Expo, Rádio Renascença Canal 1 e RFM. Estes canais
emitiam no bloco 12B da faixa VHF (frequência central: 225,648 MHz).
Alguns anos depois, o Grupo Renascença abandonou o sistema. A RDP
decidiu, então, colocar a RDP África e a RDP Internacional; a Antena 1,
Antena 3, RDP África e RDPi emitiam a 192 kbps, enquanto que a Antena
2, mercê das características da estação, operava a 224 kbps. De referir
que a emissora católica portuguesa enviava as emissões para o centro de
produção da RDP, onde estas eram reencaminhadas (através de uma linha
X.21) juntamente com as rádios públicas para a rede de emissores.
Dos 74 emissores inicialmente planeados, a RDP instalou apenas 44, rede
que servia 72% da população em 2006. Em meados de 2009, a rede DAB era
composta pelos seguintes emissores:
Continente:
Aljustrel, Arestal, Arrábida (Setúbal), Bornes, Braga, Bragança,
Darque, Vila Boim (Elvas)(1), Faro, Gardunha, Grândola, Guarda, Janas,
Leiria, Lisboa (Monsanto), Lousã, Marão, Marofa, Mendro, Monchique
(Fóia), Montejunto, Muro, Monte Pelados (Loulé), Portalegre, Monte da
Virgem, Chãos (Santiago do Cacém), Serra de Santo António (Alcanena),
Valença e Viseu.
Açores:
Cabeço Verde, Espalamaca, Monte das Cruzes, Pico Alto de Santa Maria,
Pico da Barrosa, Pico do Jardim, Ponta Delgada, Santa Bárbara e Serra
do Cume
Madeira: Cabo Girão, Gaula,
Monte (Funchal), Pico do Areeiro, Pico do Facho, Porto Santo e Ribeira
Brava.
No final dos anos 2000, a rádio pública tinha(2)
em fase de projecto vários emissores no continente: Penedono,
Alvaiázere, Mação, Serra de Monfurado (Montemor-o-Novo), Serra de Ossa
(Estremoz), Vila Verde de Ficalho (Serpa), Corte da Velha (Mértola) e
Balurcos (Alcoutim). Destes, apenas o da Serra de Ossa viu a luz do dia
mas apenas em VHF-FM, jamais tendo emitido DAB. Os restantes nunca
saíram do papel.
No dia 1 de Abril de 2011, a
RTP, com autorização da tutela e da ANACOM, desligou a rede DAB por
contenção de custos. Na realidade, o DAB era uma tecnologia cara para
uma audiência assaz escassa. O investimento total no DAB por parte da
Rádio Pública ascendeu a cerca de 11 500 000 euros, dos quais 8,5
milhões para o continente, 1 milhão de euros para a Madeira e o
remanescente para o arquipélago dos Açores. Outra das razões invocadas
para a desactivação do sistema foi a falta de um enquadramento legal
para a colocação de mais rádios no sistema. De facto, as sucessivas
revisões da lei da rádio têm adiado esta situação,, remetendo o
capítulo da rádio digital para uma legislação futura. Outro argumento
perfeitamente plausível é a existência de emissores adquiridos nos
finais da década de 90 a empresas que, por terem cessado actividade ou
por outros motivos, não podem dar assistência técnica aos equipamentos;
não esquecer que foram 13 anos de emissões regulares, tempo mais que
suficiente para o desgaste de componentes e porventura uma ou outra
avaria técnica que pode não ser facilmente resolvida pela rádio pública
sem a aquisição de equipamentos novos.
E os ouvintes? Como foi referido, o DAB tinha uma audiência pouco acima
do zero. A escassez de receptores no mercado aliada à escassa oferta de
rádios e a desinteresse das rádios privadas no sistema levaram a que a
esmagadora maioria da população jamais tivesse contacto com a rádio
digital. Ao contrário do que sucede com a Televisão Digital Terrestre,
por exemplo (em que a oferta de descodificadores e televisores
compatíveis têm aumentado ao longo dos últimos anos), a venda de
receptores DAB em Portugal foi sempre muitíssimo reduzida, sendo feita
essencialmente por audiófilos que pretendiam ouvir a Antena 2 com uma
qualidade de som superior à das emissões convencionais em VHF-FM ou
porventura por um ou outro curioso das novas tecnologias de rádio. A
falta de funcionalidades adicionais no DAB além da melhor qualidade de
som também não ajudou a cativar ouvintes.
Relativamente ao futuro: o relançamento da rádio digital em Portugal
deve considerar alternativas mais tecnologicamente avançadas que o DAB.
Com o advento de sistemas como o DAB+ e o DMB, a par do DRM (Digital
Radio Mondiale), entre outros, não se justifica apostar num sistema
concebido há mais de 20 anos e que, apesar das vantagens, não deixa de
apresentar vários problemas. Entre os quais, destaque-se a correcção de
erros pouco eficaz do DAB comparada com a oferecida pelo DAB+, factor
que pode ser decisivo para uma recepção adequada em zonas menos bem
servidas por emissores. Além disso, boa parte da infra-estrutura da RTP
(torres de emissão, elementos radiantes, etc) utilizada para o DAB
poderia ser actualizada para o DAB+.
Bibliografia/hiperligações
úteis:
(1) Mencionado num dcumento da RTP de 2009; não se sabe se chegou
efectivamente a emitir.
(2) Segundo informações do utilizador "TMG" no Fórum da Rádio