Mundo da Rádio

  Rádio antigo Capehart International

Como criar uma rádio local em Portugal


    Na sequência das dezenas de mensagens electrónicas que tenho recebido ao longo dos anos a questionarem-me como se pode criar uma rádio, não resisti a escrever este artigo com o objectivo de desmistificar o assunto.


1ª regra: (não) comparar o lançamento de uma rádio com a abertura de uma mercearia de bairro

   A frase provocatória serve de alerta para as especificidades do mercado radiofónico, que devem ser tidas em conta no planeamento do modelo de negócio. Montar uma rádio exige um estudo aprofundado acerca da programação que se pretende oferecer, dos meios humanos e técnicos que serão necessários ao cumprimento dos objectivos traçados e, acima de tudo, da viabilidade económica do projecto. Desde a aquisição do alvará até ao arranque da estação, há muito trabalho por fazer, desde a contratação de pessoal à montagem dos estúdios, da instalação do emissor VHF-FM até à ligação do microfone. Não caia na tentação de "partir à aventura", sob pena de rapidamente se arrepender. Estude cuidadosamente o projecto e não hesite em falar com pessoas do ramo, de forma a ganhar conhecimento útil a respeito do funcionamento de uma rádio.


2ª regra: não dar um passo maior que a perna


    Se quer entrar no mercado radiofónico, não ambicione logo a aquisição de uma rádio nacional ou regional, a não ser que tenha muito bons conhecimentos no ramo, uma capacidade económica compatível com um projecto de grande envergadura e tenha a oportunidade de concretizar o negócio. Como é extremamente improvável que reuna as três condições, pense antes em investir numa rádio local. Mais uma vez, pense num projecto com pés, mãos e cabeça e adeque-o às condições financeiras do investimento. É fácil cair na ilusão de conseguir chegar ao topo, pelo que não nos devemos esquecer que «quanto mais alto é o voo, maior é a queda».


    Feitos os alertas pertinentes, passemos, então, a questões mais práticas:


1º passo: obter informações úteis a respeito da radiodifusão em Portugal

    Antes de "agarrar " qualquer oportunidade de negócio (falaremos disso no 2.º passo), reúna informações pertinentes a respeito do enquadramento técnico e legal das rádios locais. Não hesite em contactar a ANACOM, a ERC e a APR (Associação Portuguesa de Radiodifusão). No caso da estação pretender seguir uma linha de orientação próxima de ideais cristãos, vale a pena entrar em contacto com a ARIC (Associação das Rádios da Inspiração Cristã).


2º passo: considerar as várias possibilidades de entrada no mercado da radiodifusão


Começando pela parte legal: uma rádio necessita de ter alvará para operar legalmente em Portugal. Alvará esse que é atribuído pelas autoridades competentes (ERC) a determinada sociedade de radiodifusão legalmente constituída. Assumindo estar em condições (económicas, legais, etc.) de criar uma estação de rádio, terá duas possibilidades: ou candidata-se num eventual concurso de atribuição de frequências lançado pelo governo ou poderá adquirir o alvará de uma rádio já existente. Analisemos, então, cada uma das situações:


Opção A - concurso público de atribuição de frequências 


    Das duas opções esta é seguramente a mais arriscada porquanto depende da vontade do governo, sob consulta e supervisão da  ANACOM e da ERC, a abertura de um concurso público para a atribuição de licenças a operadores de radiodifusão local. Primeiro problema: a avaliar pela saturação do espectro, é muito pouco provável que as principais malhas urbanas do país (Lisboa e Porto) tenham frequências disponíveis para oferta em concurso. Na regulamentação dos últimos concursos estavam essencialmente concelhos sem rádio local (ou porventura apenas com uma), cujas frequências a jogo têm potência máxima autorizada de 500 W (exceptuando um ou outro caso). Outro problema (evidente): tratando-se de um concurso, nada está garantido até ao fim; basta recordar o caso em que a ANACOM excluiu todas as candidaturas a certo concelho devido a erros no projecto técnico apresentado por cada uma das sociedades concorrentes, obrigando a ERC a rejeitar liminarmente tais processos. Daqui conclui-se que o recurso a este cenário pode, porventura, ser um bom negócio, mas tem bastantes riscos associados. 

Opção B - aquisição do alvará de uma rádio já existente


    Muito menos arriscada que a primeira situação,trata-se de uma possibilidade que também não está isenta de problemas. Aconselha-se máxima cautela na análise da proposta de negócio, já que um bom preço pode ocultar problemas legais, fiscais e económicos da entidade proprietária da estação; havendo dívidas significativas, o comprador terá de assumi-las, daí a importância de conhecer verdadeiramente a situação financeira da rádio antes de aceitar qualquer negócio. Admitindo o consentimento informado do comprador e a intenção de prosseguir com o negócio, a entidade proprietária e vendedora do alvará deverá apresentar junto da ERC um requerimento de alteração do controlo do operador radiofónico em causa, de forma a que esta entidade delibere a aprovação (ou não) da transferência do alvará, reservando-se ao direito de (se assim os membros da entidade reguladora o entender), impôr eventuais condições para a autorização definitiva.



3º passo: instalação dos estúdios, aquisição de equipamento, contratação de pessoal e outras decisões essenciais para o funcionamento de uma estação de radiodifusão local

    Passando para a parte técnica, como também se poderá (e deverá) pensar, existe um número elevado de pormenores a considerar... e cada caso é um caso. Dependendo das condições técnicas e económicas da estação, dever-se-á escolher os equipamentos a adquirir.  Em primeira instância, teremos de considerar as condições impostas pela ANACOM à estação. Refiro-me à potência aparente radiada (PAR) atribuída, a eventuais limitações técnicas impostas (possível limitação de altitude do local da torre; eventuais limitações de azimute de emissão, entre outros importantes pormenores técnicos que terão de ser integralmente respeitados pelas rádios locais ) - pormenores esses que obviamente variam de emissor para emissor, conforme as especificidades de cada um.  Partindo da pior situação, isto é, se a rádio não tiver ainda equipamentos de emissão, será necessária a aquisição de um emissor FM, excitador, além das antenas de emissão e, obviamente, a torre de emissão, entre outros equipamentos. Será necessária a consulta de um técnico qualificado (Engenheiro responsável pela rádio), que faça uma avaliação técnica da situação.  Dentro dos estúdios, a par dos aparelhos óbvios (microfones, gravadores, etc.), terá de ter, entre outros componentes, o processador de som, o RDS (se a rádio pretende emitir Radio Data System), PC de emissão, etc. ; como se deve facilmente depreender, o que deve ou não adquirir depende das circunstâncias (mais uma vez, um técnico competente saberá sugerir as melhores soluções, também tendo em conta os custos... ). Como é óbvio, qualquer projecto técnico [mormente a parte de emissão radioeléctrica] estará sujeito a autorização da ANACOM (tendo em conta as questões já referidas).  Em todo o caso, certamente valerá a pena consultar páginas de empresas de equipamentos de radiodifusão, onde se poderá ter uma ideia dos equipamentos que estas empresas oferecem.

   Quanto a custos... Será difícil imaginar colocar um projecto com a (relativa) complexidade de uma rádio local, sem esperar gastar uns bons milhares de euros! Daí que, além da inevitável análise de viabilidade económica da estação, terá de ter em conta o mercado publicitário da região onde a rádio se insere; se este estiver relativamente saturado, será difícil amortizar o investimento, mas se existir pouca concorrência, será mais fácil vender publicidade. Escusado será dizer que, tirando possíveis (reduzidos) apoios de algumas entidades, uma rádio, para sobreviver, não terá outra escolha senão vender publicidade para fazer face aos investimentos e despesas...

   Se realmente pretender seguir em frente, só lhe posso sugerir que não se deixe desmotivar pelas burocracias e vá à luta! Não será fácil, mas com insistência, poderá montar uma nova rádio, Um caminho difícil, mas que muitos percorreram com êxito. Outros nem tanto, também dependendo da sorte de conseguir ou não um alvará. É um risco que terá de aceitar, mas, novamente, encorajo-o(a) a não desistir aos primeiros problemas.

Redes Sociais

FacebookTwitterYouTubeBloggerreddit


Visitas